C A L L C E N T E R - PREFEITURA DE SP É CONDENADA A INDENIZAR OPERADORA DE CALLCENTER POR ASSÉDIO MORAL SOFRIDO NA EMPRESA CONTRATADA

29/10/2013 19:21

A JUSTIÇA DO TRABALHO ENTENDEU QUE ERA DEVER DA PREFEITURA FISCALIZAR O CUMPRIMENTO DAS OBRIGAÇÕES CONTRATUAIS PELA EMPRESA DE CALLCENTER CONTRATADA. ASSIM, PELA SUA NEGLIGÊNCIA E FALHA NA FISCALIZAÇÃO NO LOCAL DE TRABALHO, QUE PERMITIU QUE A EMPRESA COMETESSE ASSÉDIO MORAL CONTRA FUNCIONÁRIA, A PREFEITURA FOI CONDENADA EM CONJUNTO COM A EMPRESA DE CALLCENTER CONTRATADA

Segue decisão:

PROCESSO TRT/SP nº 0069100-58.2009.5.02.0030 - 7ª TURMA
 
P. R. DE CARVALHO
CALL TECNOLOGIA E SERVIÇOS LTDA.
MUNICÍPIO DE SÃO PAULO
RECORRIDOS: OS MESMOS
 

CULPA IN VIGILANDO

 

Com efeito, a contratação da primeira reclamada mediante regular procedimento de licitação, remete à aplicabilidade da Lei 8.666/93 e ao atual entendimento jurisprudencial cristalizado pelo inciso V da Súmula 331, do C. TST, no sentido de que a responsabilidade dos entes integrantes da Administração Pública direta e indireta decorre de sua conduta culposa na fiscalização do cumprimento das obrigações contratuais e legais da prestadora de serviços e não do mero inadimplemento das obrigações trabalhistas.

 

Isso porque o Plenário do E. STF, na sessão do dia 24 de novembro de 2010, ao julgar a Ação Direta de Constitucionalidade nº 16, afirmou a constitucionalidade do § 1º, do artigo 71, da Lei 8.666/91, o qual estabelece: "A inadimplência do contratado, com referência aos encargos trabalhistas, fiscais e comerciais não transfere à Administração Pública a responsabilidade por seu pagamento”., tendo aquela Corte dado provimento a diversos agravos regimentais em reclamações em que se discute a ofensa à Súmula Vinculante 10, decorrente da aplicação irrestrita do inciso IV, da Súmula 331 do C. TST, razão pela qual a responsabilidade subsidiária dos entes integrantes da Administração Pública direta e indireta, relativamente aos débitos trabalhistas não satisfeitos pelo prestador de serviços terceirizados, só ocorre quando evidenciada a conduta culposa da administração no cumprimento das obrigações da Lei 8.666/93, observando-se que a responsabilidade do tomador decorre da culpa in eligendo e in vigilando, que tem como fundamento legal os artigos 186 e 927 do Código Civil.

 

Na hipótese dos autos, considerando o reconhecimento da rescisão indireta do contrato e o dano moral, decorrente de práticas ilícitas do empregador, prestador de serviços, a teor do aresto de fls. 178/181, resta comprovada a conduta culposa da segunda ré, ensejadora de responsabilidade nos moldes dos artigos 186 e 927 do Código Civil, por descumprimento do dever de fiscalização que se extrai da Lei 8.666/93, posto que não observou o dever de vigilância da atividade contratada no intuito de coibir irregularidades praticadas pelo contratado em relação aos trabalhadores postos à disposição do ente público, tal como prevê o artigo 71 da Lei em comento.

 

Releva notar que do aresto de fls. 178/181 constou que:

 

“(...) Acresça-se não pairarem dúvidas de que a recorrente foi beneficiária direta da força de trabalho discutida na lide, desdobrada em prestação pessoal de serviços inseridos no desenvolvimento e funcionamento de suas atividades como tomador. Como bem se sabe, a terceirização tolerável, conforme jurisprudência predominante, é a que se limita a algumas funções não relacionadas à atividade fim do beneficiário e que propiciem não identificá-lo como sendo o efetivo empregador. Ainda que empregador não seja, o tomador dos serviços não se exime de alguns deveres, ônus e riscos que emergem da relação de emprego desenvolvida sob sua órbita de responsabilidade subjetiva, inclusive social.

Tratando-se de ente público, os rigores da Lei Civil e Trabalhista aplicáveis ao caso concreto orientam a que se redobrem as cautelas pois, como é notório, o setor possui susceptibilidade à disseminação de máculas que se imunizam pela observância do interesse público e comum a todos.

Tanto assim é que a própria Lei de Licitações, em seu artigo 67 prescreve que ‘A execução do contrato deverá ser acompanhada e fiscalizada por um representante da Administração especialmente designado, permitida a contratação de terceiros para assisti-lo e subsidiá-lo de informações pertinentes a essa atribuição’.”

 

E justamente aí constata-se a culpa in vigilando da Municipalidade, tomadora dos serviços, posto que contratou empresa para prestação de serviços de seu interesse, porém estes eram executados longe e isentos de qualquer fiscalização, resultando daí que a trabalhadora, vítima de ostensivo e intenso assédio moral no local de trabalho, não tinha a quem recorrer, já que a tomadora sequer visitava o local onde os serviços eram executados, deixando de tomar conhecimento de eventuais irregularidades praticadas por prepostos da empresa contratada, do que inclusive resultou a rescisão indireta do contrato de trabalho por culpa do empregador.

 

Nesse sentido, o item V da Súmula 331 do C. TST e o teor das ementas abaixo:

 

“...RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. 1. Nos termos do disposto no § 1º do artigo 71 da Lei n.º 8.666/93, a inadimplência do contratado, com referência aos encargos trabalhistas, fiscais e comerciais não transfere à Administração Pública a responsabilidade por seu pagamento, nem poderá onerar o objeto do contrato ou restringir a regularização e o uso das obras e edificações, inclusive perante o Registro de Imóveis-.

2. O Supremo Tribunal Federal, ao julgar a Ação Declaratória de Constitucionalidade n.º 16, ajuizada pelo Governador do Distrito Federal, decidiu -que a mera inadimplência do contratado não poderia transferir à Administração Pública a responsabilidade pelo pagamento dos encargos-. Reconheceu, todavia, a Corte suprema, -que isso não significaria que eventual omissão da Administração Pública, na obrigação de fiscalizar as obrigações do contratado, não viesse a gerar essa responsabilidade- (informativo n.º 610 do Supremo Tribunal Federal). 3. Na hipótese dos autos, o Tribunal Regional atestou que a administração pública não observou seu dever de fiscalizar o cumprimento do contrato administrativo, revelando-se incensurável, portanto, a decisão por meio da qual se condenou a segunda reclamada, de forma subsidiária, ao pagamento dos créditos trabalhistas deferidos ao obreiro... (RR - 1630500-29.2002.5.09.0004 , Relator Ministro: Lelio Bentes Corrêa, Data de Julgamento: 11/05/2011, 1ª Turma, Data de Publicação: 20/05/2011)” – grifei.

“AGRAVO DE INSTRUMENTO. RESERVA DE PLENÁRIO. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. DESPROVIMENTO. Nos termos do entendimento manifestado pelo E. STF, no julgamento da ADC-16, em 24/11/2010, é constitucional o art. 71 da Lei 8.666/93, sendo dever do judiciário trabalhista apreciar, caso a caso, a conduta do ente público que contrata pela terceirização de atividade-meio. Necessário, assim, verificar se ocorreu a fiscalização do contrato realizado com o prestador de serviços. No caso em exame, o ente público não cumpriu o dever legal de vigilância, registrada a omissão culposa do ente público, ante a constatada inadimplência do contratado no pagamento das verbas trabalhistas, em ofensa ao princípio constitucional que protege o trabalho como direito social indisponível, a determinar a sua responsabilidade subsidiária, em face da culpa in vigilando. Agravo desprovido. ( AIRR - 1599- 46.2010.5.02.0000 , Relator Ministro: Aloysio Corrêa da Veiga, Data de Julgamento: 11/05/2011, 6ª Turma, Data de Publicação: 20/05/2011)” – grifei.

Assim, considerando o teor do acórdão desta Turma às fls. 178/181 e as razões de decidir acima, o reconhecimento da culpa in vigilando do Município reclamado é medida que se impõe.

Isto posto, ACORDAM os Magistrados da 7ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região, em cumprimento ao V. Acórdão do C. TST às fls. 220/226, reconhecer a culpa in vigilando do Município de São Paulo nos termos da fundamentação do voto.

DÓRIS RIBEIRO TORRES PRINA

Desembargadora Relatora