Empresa de Call Center é condenada a pagar indenização de R$ 9.000,00 a empregada por perseguição de superior, e ainda, teve o pedido de demissão revertido para "dispensa sem justa causa" pelo empregador.

27/06/2013 12:49

 

A empresa "CALL TECNOLOGIA" foi condenada a pagar indenização a funcionária por assédio moral praticado por supervisora. Segundo relatado no processo a empregada, que trabalhou por 04 meses na empresa, pediu demissão por não suportar a perseguição que vinha sofrendo de sua supervisora.

Diante do quanto relatado pelas testemunhas da empregada, que confirmaram a perseguição, o Juiz determinou o pagamento de indenização no valor de R$ 9.000,00 por danos morais, e ainda, reverteu o pedido de demissão para demissão sem justa causa, dando direito á empregada de recebimento de indenização pelo aviso-prévio (um salário), 40% de multa do FGTS, levantamento do FGTS e seguro desemprego que deverá ser indenizado pela empresa.

A empresa recorreu da decisão, porém o Tribunal do Trabalho de São Paulo reconheceu o direito da empregada e negou provimento ao recurso da empresa, confirmando a decisão do Juiz.

 

DA NULIDADE DO PEDIDO DE DEMISSÃO

Alega a reclamante, na petição inicial, que, admitida em 10/11/2008, foi forçada a pedir demissão em 25/03/2009, tendo em vista o assédio moral sofrido. 

Defendendo-se, a reclamada afirma que a reclamante apresentou pedido de demissão por livre e espontânea vontade, não havendo qualquer mácula na declaração de vontade. 

Contudo, os elementos contidos nos autos dão razão à reclamante. 

Em primeiro lugar, o princípio da continuidade da relação de emprego constitui presunção favorável ao empregado, nos termos da Súmula nº 212 do TST. 

De outro lado, a prova oral trazida aos autos corrobora a tese contida na petição inicial, fazendo ver que a reclamante foi vítima de assédio moral, caracterizando-se por atos repetidos de violência moral, de tortura psíquica, e de intenção de degradar as condições de trabalho da empregada. 

De fato, a 1ª testemunha da reclamante asseverou que a coordenadora A. da Silva tratava a reclamante de forma desrespeitosa, cobrando serviços com palavras agressivas e xingamentos (como ignorante e incompetente) e atribuindo resoluções de problemas de departamento de pessoal (fora da competência da reclamante), de forma agressiva e com palavras de baixo calão. Tais acontecimentos ocorreram várias vezes. (...). Referido tratamento desonroso ocorria na presença dos demais funcionários. Chegou a presenciar a Sra. A. da Silva fazendo comentários a respeito da capacidade profissional da reclamante, chamando-a de incompetente e dizendo que se ela não advertisse adequadamente sua equipe por não cumprir determinadas normas da reclamada, sofreria pessoalmente as conseqüências (fazendo isso na frente dos demais funcionários). A depoente presenciou a reclamante passando mal e chorando em virtude do tratamento a ela dispensado pela Sra. A. da Silva, e a acompanhou até a gerente de operações para formalizarem a reclamação sobre o ocorrido, mas a reclamada não tomou qualquer providência. A reclamante chorou várias vezes devido aos acontecimentos narrados. Devido ao assédio sofrido, a reclamante pediu demissão, inclusive comentando com a depoente antes de pedir demissão (por isso foram até a gerência). ” (fls. 33). 

Já a 2ª testemunha da reclamante afirmou que a coordenadora A. da Silva, muitas vezes, gritava com a reclamante e a ela se dirigia com palavras de baixo calão, na presença de outros funcionários, sendo que 2 operadoras chegaram a reclamar com a gerente geral sobre o tratamento dado à reclamante, mas nenhuma providência foi tomada. Esse tratamento ocorria com freqüência. (...). Chegou a ver a reclamante chorando e deprimida por causa dos fatos narrados, inclusive quando voltava de reuniões na sala da gerência, com os coordenadores, sendo que quando a reclamante foi assaltada sequer pôde se ausentar para fazer o B.O. A sala onde ocorriam as reuniões ficava perto do local de trabalho da depoente e havia um vidro, razão pela qual podia ouvir os gritos da Sra. A. da Silva dirigidos a todos os supervisores. A reunião das coordenadores era feita sempre nessa sala da gerência onde havia o vidro. Havia uma sala para feed-back dos supervisores com os operadores, que tinha o tamanho de um banheiro. Quando a reclamante fazia reunião com os operadores, todos os 30 funcionários tinham que caber nessa sala. A reclamante não trabalha mais na reclamada por causa do assédio descrito, sendo que a Sra. A. da Silva, nesse dia, gritou com a reclamante por causa de um erro do departamento de pessoal. ” (fls. 34). 

Nenhuma contraprova produziu a reclamada capaz de infirmar esses depoimentos. 

Não servem para tanto os documentos trazidos com a defesa, em especial os e-mails de fls. 79/80, sendo que a autora nega a autoria do doc. 08, não havendo provas suficientes de que outra pessoa não poderia enviar mensagens através do endereço eletrônico corporativo da reclamante. Mesmo porque, a 1ª testemunha da reclamada asseverou que  “Cada supervisor tinha uma senha para login, a mesma que era utilizada para abrir o Windows o e-mail, sendo que, quando era aberta a máquina com a senha do funcionário, automaticamente era aberto o e-mail. (...). Enquanto o supervisor não recebe sua senha, pois a mesma demora alguns dias até ser fornecida a matrícula, é aberta uma  ‘tela de supervisores’ para acompanhar o trabalho dos operadores, quando é utilizada a senha de outro supervisor, o qual é chamado de ‘carrapato’, pois está treinando o novo supervisor.” (fls. 34/35). Além disso, o conteúdo de referidas mensagens não afasta a realidade demonstrada pela prova testemunhal. 

Também não serve para infirmar a prova oral produzida pela reclamante os depoimentos das testemunhas patronais. 

Isso porque, a 1ª testemunha da reclamada limita-se a aduzir que  “A Sra. A. da Silva nunca se dirigiu de forma desrespeitosa à reclamante ou a outros funcionários, tampouco a autora reclamou com a depoente a respeito. Nunca tomou conhecimento de qualquer funcionário que tenha reclamado do tratamento dispensado pela Sra. A. da Silva. (...). O relacionamento da reclamante com a Sra. A. da Silva era ‘normal de supervisor e coordenadores’. Não estava presente no momento, mas sabe que a reclamante pediu demissão, não tendo informação de que tenha sofrido qualquer pressão. (...). A depoente chegou a chorar no serviço por outros motivos que não foram o tratamento a ela dispensado pela Sra. A. da Silva, de quem a depoente não é amiga pessoal. ” (fls. 34/35). 

Já a 2ª testemunha da reclamada assevera apenas que  “Nunca soube ou presenciou qualquer reclamação dos funcionários em relação ao tratamento dispensado pela Sra. A. da Silva aos funcionários, o qual era normal e respeitoso. (...). A reclamante procurou o depoente para pedir demissão, sendo que o depoente a encaminhou para a gerente, mas mesmo assim a reclamante decidiu pedir demissão, não tendo sofrido pressão para tanto, sendo que não falou para o depoente o motivo do pedido. (...). O relacionamento da reclamante com a Sra. A. da Silva era normal. O sindicato às vezes comparece na reclamada para fazer vistorias e campanhas, não para ouvir reclamações dos funcionários. (...). O depoente ficou afastado da reclamada em dezembro de 2008 (dos dias 19.12.2008 a 05.01.2009) devido ao falecimento de sua mãe, e esteve em férias em fevereiro de 2009. A coordenadora da reclamante era a Sra. A. da Silva. A reclamante pediu demissão ao depoente e não à sua coordenadora, pois a Sra. A. da Silva não estava presente na ocasião. Na ocasião da demissão a reclamante nada reclamou com o depoente sobre a Sra. A. da Silva, e, se reclamou, foi para a gerente, mas o depoente não estava presente. Nunca viu nenhum funcionário chorando em virtude do tratamento dado pela Sra. A. da Silva, apenas viu as cobranças normais, assim como ele também cobra. (...). Quando a reclamante pediu demissão ao depoente, este lhe disse que  ‘de repente poderiam oferecer alguma coisa para que ela não pedisse demissão’, mas não lhe prometeu nada especifico. ” (fls. 35/36). 

Por fim, a 3ª testemunha da reclamada disse que  “Nunca viu a Sra. A. da Silva gritando ou falando palavras de baixo calão aos funcionários, apenas exige perfeição no serviço e às vezes fala alto porque a operação é grande. O relacionamento da Sra. A. da Silva com a equipe é normal. ” (fls. 36). 

Aplica-se ao caso o entendimento contido no seguinte aresto: 

 “136056790  – 1- ASSÉDIO MORAL  – CARACTERIZAÇÃO  – INDENIZAÇÃO  – ÔNUS DA PROVA  – O assédio moral é modalidade de comportamento abusivo, e se traduz em gestos, palavras e atitudes, que ameaçam, por sua repetição, a integridade física ou psíquica de uma pessoa, degradando o ambiente de trabalho. Incumbe ao empregado o ônus de provar o assédio sofrido, enquanto fato constitutivo de seu direito (CLT, artigo 818). Se os depoimentos das testemunhas trazidas a Juízo são válidos e consistentes, e se revelam aptos a corroborar as acusações de que o gerente da reclamada coagia psicologicamente o reclamante, tratando-o de forma humilhante, há suporte jurídico à conclusão de que o obreira foi vítima de assédio moral no trabalho, ensejando a indenização perseguida. (...). (TRT 10ª R.  – RO 00700-2008-018-10-00-3  – 2ª T.  – Rel. Juiz Gilberto Augusto Leitão Martins  – J. 18.02.2009) ”. In CD Juris Síntese IOB. São Paulo: IOB Thomson, nº 76, março/abril de 2009. 

Desse modo, os depoimentos das testemunhas da reclamante mostram-se válidos e consistentes, corroborando as acusações de que a coordenadora da reclamada coagia psicologicamente a autora, tratando-a de forma humilhante, pelo que há suporte jurídico à conclusão de que a obreira foi vítima de assédio moral no trabalho, ensejando a presunção de vício de consentimento no pedido de demissão. 

Assim sendo, acolho o pedido de rescisão indireta do contrato de trabalho em 25/03/2009, conforme artigo 483, alínea ‘e’, da CLT, e condeno a reclamada ao pagamento das seguintes verbas: aviso-prévio indenizado; 13º salário proporcional (04/12); férias proporcionais acrescidas de 1/3 (04/12). 

Ante a configuração da rescisão indireta do contrato de trabalho, a reclamada deverá fornecer o TRCT com código 01, a fim de possibilitar o soerguimento do FGTS da conta vinculada da reclamante, em até 15 (quinze) dias do trânsito em julgado, sob pena de multa diária em favor da autora de 01/30 do seu salário, observado o limite máximo de um salário mensal, pelo descumprimento desta obrigação de fazer (artigo 461 do CPC). Na inércia da reclamada, fica desde já autorizada a expedição de alvará para levantamento do FGTS porventura depositado na conta vinculada da reclamante. 

A reclamada também deverá fornecer as guias de Comunicação da Dispensa (CD) e Requerimento do Seguro Desemprego (RSD), em até 15 (quinze) dias do trânsito em julgado, sob pena de responder por indenização equivalente, consoante item II da Súmula nº 389 do TST, de seguinte teor:  “O não-fornecimento pelo empregador da guia necessária para o recebimento do seguro-desemprego dá origem ao direito à indenização. ” 

3. DO DANO MORAL

Para a configuração do dano de natureza material ou moral, faz-se necessária a ocorrência concomitante de três requisitos, quais sejam, a existência de um dano a ser reparado (prejuízo material ou o sofrimento moral), o ato ilícito (artigo 186 do Código Civil Brasileiro) e o nexo de causalidade entre o ato praticado e o dano sofrido. 

No caso, os elementos trazidos aos autos demonstram que restaram preenchidos os requisitos configuradores supracitados. 

Os documentos trazidos aos autos, aliados aos depoimentos colhidos em audiência, faz ver a atitude temerária de preposto do empregador, que intimidou e humilhou a reclamante, trazendo-lhe insegurança e desconforto pelo modo que foi conduzido o contrato de trabalho, em especial a sua ruptura. 

Reporto-me aos depoimentos das testemunhas transcritos no tópico anterior, ressaltando que a prova produzida pela reclamada não logrou invalidar os fatores de verdade trazido pela reclamante. 

Ora, no  âmbito das relações de trabalho, o assédio moral configura-se como conduta abusiva do empregador ou de seus prepostos, mediante a qual fica exposto o empregado, de forma reiterada, a situações vexatórias, humilhantes e constrangedoras, as quais atentam contra a sua dignidade e integridade psíquica e, assim, violam o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana (artigo 1º, inciso III, da Constituição Federal). 

Nesse sentido o seguinte aresto: 

“42163902 – ASSÉDIO MORAL NAS RELAÇÕES DE TRABALHO  – DANO MORAL PRESUMÍVEL  – RESPONSABILIDADE CIVIL SUBJETIVA DO EMPREGADOR  – No  âmbito das relações de trabalho, o assédio moral configura-se como conduta abusiva do empregador ou de seus prepostos, mediante a qual fica exposto o obreiro, de forma reiterada, a situações vexatórias, humilhantes e constrangedoras, as quais atentam contra a sua dignidade e integridade psíquica e, assim, violam o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana (art. 1º, inciso III, CF). O assédio moral resulta em dano moral que independe de prova, porque presumível, mesmo porque não se prova dor psíquica. O que se coíbe é a conduta lesiva do agente assediador, ou seja, o assédio moral como violação de um direito à dignidade da vítima. Desse modo, uma vez provada conduta ilícita do empregador que caracterize assédio moral, dá-se ensejo à responsabilidade civil subjetiva deste, porquanto provados os três elementos essenciais para a sua configuração- O dano, o nexo causal entre este e a conduta abusiva do empregador, e o elemento anímico (o dolo). (TRT 5ª R.  – RO 00279-2008-011-05-00-3  – 2ª T.  – Relª Luíza Lomba– J. 22.01.2009) ”. In CD Juris Síntese IOB. São Paulo: IOB Thomson, nº 76, março/abril de 2009. 

No caso, houve plena demonstração da presença das hipóteses ensejadoras da reparação por dano moral, uma vez que findaram provados o dano, a conduta lesiva da empresa e o nexo causal entre ambos, impondo-se o dever de reparação pela reclamada. 

Por tais razões, arbitro a indenização por dano moral no importe de R$ 9.000,00 (nove mil reais), valor compatível com a ofensa perpetrada, bem assim com a capacidade econômica da reclamada, sem perder de vista o caráter pedagógico da penalidade.